sábado, 2 de junho de 2012

A Teoria Austríaca dos Ciclos Econômicos


Ontem foi divulgado o (pequeno) crescimento de 0.2% do PIB do Brasil no primeiro trimestre de 2012 (AQUI). Os primeiros questionamentos sobre o modelo de crescimento brasileiro começam a aparecer e o Brasil já cresce menos que alguns países em crise na Europa. Para entender um pouco melhor sobre o porque deste baixo crescimento escrevi um pequeno resumo sobre a teoria da escola austríaca de economia sobre os ciclos econômicos.


A Teoria Austríaca dos Ciclos Econômicos procura explicar como os distúrbios monetários provocam ausências de coordenação entre os diferentes estágios de produção. Estas faltas de coordenação resultam em booms artificiais, que ao serem descobertas pelos agentes econômicos provocam recessões, que por sua vez desencadeiam uma reestruturação da economia.

O início do distúrbio monetário começa com a formação da poupança forçada, que é promovida pelo banco central através de uma redução artificial da taxa de juros, realizada com o aumento da base monetária e não por uma genuína propensão a diminuição do consumo e aumento da poupança. O crescimento da oferta de moeda acarreta uma abundância de recursos disponíveis para empréstimos. Esta abundância de recursos surge da diferença entre a poupança planejada e a poupança observada, advinda da expansão da base monetária.

A redução da taxa de juros e o aumento da oferta de crédito fazem com que
antes não eram economicamente viáveis se tornem rentáveis. Isto provoca um alargamento na estrutura de produção, ou seja, há um maior investimento nas etapas de produção mais distantes do consumo final. Os agentes econômicos são “enganados” pelas taxas de juros baixas, o que a princípio indicaria um alto grau de poupança, indicando que as pessoas estão poupando mais agora para consumirem no futuro, mostrando que houve uma mudança na preferencia temporal. Tudo isso faz com que os investimentos de longo prazo pareçam viáveis e rentáveis, propiciando o ambiente necessário para que ocorra um alargamento na estrutura de produção.

Os investimentos gerados nas etapas mais distantes do consumo final geram um aumento no emprego e na renda das pessoas que trabalham nestes setores, dando início a fase do boom econômico, onde ocorre um aumento da renda e diminuição do desemprego. Este aumento do emprego e da renda faz com que o consumo também aumente, uma vez que a propensão ao consumo e a preferência temporal na verdade não foram modificadas.

Com o passar do tempo, o crescimento com os gastos em bens de consumo fica cada vez maior e com isso começa um “cabo-de-guerra” entre os setores mais próximos ao consumo com os setores mais distantes. Esta disputa faz com que os preços dos bens de capital aumentem assim como as taxas de juros, além de gerar escassez de capital nos setores que tiveram sua expansão iniciada depois dos estágios de bens de capital.

Nesta fase, todos os estágios da estrutura de produção estão competindo por loanable funds, e com isso as taxas de juros tanto de longo quanto de curto prazo sofrerão aumentos. No entanto, é esperado que as taxas de curto prazo aumentem mais. Tais aumentos nas taxas de juros geram um aperto no crédito e com isso aqueles projetos que antes se mostravam viáveis agora deixam de ser. Isso faz com que o boom inicial acabe, uma vez que os preços dos bens de capital aumentam mais em relação aos salários, fazendo com que as empresas substituam os métodos de produção poupadores de trabalho por métodos mais intensivos de trabalho. É importante notar que os primeiros são característicos dos estágios mais distantes do consumo final enquanto os últimos daqueles mais próximos dos estágios produtores de bens de consumo. Há, portanto, um crescimento dos setores voltados aos estágios próximo ao consumo e uma retração naqueles setores mais distantes.

Quando isto ocorre, é iniciada a fase de recessão, onde a expansão inicial se transforma em retração. Os novos projetos são cancelados, trabalhadores são demitidos, a substituição de equipamentos velhos é postergada, os estoques aumentam e as rendas e preços dos setores de ordem mais elevada diminuem.

É nesta fase que fica claro que a expansão artificial do crédito, através do aumento da base monetária e da poupança forçada, não gera prosperidade. O que ela pode fazer, como de fato faz, é provocar um rearranjo na estrutura de produção e criar uma ilusória e efêmera sensação de prosperidade. No entanto, moeda gerada pelo banco central não é riqueza, é apenas papel, e uma vez que a ilusão acaba os agentes voltam a realidade, e percebem que a poupança existente não era genuína.

A última fase do ciclo econômico ocorre com o fim da recessão e volta da estabilidade na economia. Ela ocorre quando as indústrias de bens de capital entram em colapso e seus preços param de cair, e simultaneamente o consumo diminui devido às quedas nas rendas dos diferentes setores da economia. Esta retração nas indústrias de bens de capital e no consumo irá ocorrer até que os vetores de oferta agregada e demanda agregada voltem a coincidir e a estrutura de produção volte novamente ao equilíbrio. É importante ressaltar que, enquanto isto não ocorrer, (ou seja, até que os projetos inviáveis sejam todos liquidados e a mão de obra antes empregada nestes estágios seja transferida para os outros setores) a crise continuará. É também válido acrescentar que um novo ciclo econômico voltará a surgir apenas se uma nova expansão monetária promovida pelo governo ocorrer.

É possível fazer uma analogia entre tudo que foi exposto e a atual crise econômica mundial. No final dos anos 90 e nos primeiros anos da primeira década deste século, o governo americano praticou taxas de juros muito baixas e encorajou fortemente o crédito, mais especificamente os empréstimos hipotecários, implementando inclusive um sistema de seguro para dar garantias aos bancos do recebimentos dos débitos de clientes inadimplentes. O resultado inicial foi um grande boom, uma grande bolha imobiliária e um enorme crescimento do setor de construção civil, seguido de uma recessão e forte contração dos setores beneficiados no início do boom, e com os preços dos imóveis caindo fortemente. Fenômenos similares ocorreram na Europa e na Ásia. No caso europeu, após a implantação do euro, diversos países se aproveitaram das baixas taxas de juros praticadas na união europeia e um enorme aumento na oferta de crédito para darem início a projetos inviáveis, gerando bolhas imobiliárias como na Espanha, Irlanda e Portugal. Em todos os casos, quando a crise estourou em meados de 2008, os governos adotaram políticas de forte expansão dos gastos públicos e reduziram ainda mais as taxas de juros. Estes mesmos governos agora enfrentam sérios problemas de dívidas públicas e dificuldades de manter suas taxas de juros baixas. Eles tentam, aumentando ainda mais a base monetária, postergar ou impedir a liquidação de projetos insustentáveis, com isso agravando ainda mais a crise. (Alguma semelhança com o Brasil hoje?)

Pode-se concluir que a Teoria Austríaca dos Ciclos Econômicos explica que a expansão artificial do crédito gera um boom inicial na economia que não pode ser mantido, uma vez que a inflação, ou expansão da moeda sem lastro em poupança real, apenas gera uma ilusão passageira de prosperidade. É justamente esse aumento na base monetária que desencadeia o início do ciclo que culmina com uma recessão e reajustamento da estrutura de produção.

Referências recomendadas:
http://www.mises.org.br/EbookChapter.aspx?id=309
http://www.mises.org.br/EbookChapter.aspx?id=427

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